13 Jul CAMUFLAGEM: ENCOUNTERS WITH LANDSCAPE
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Falar de Castelo Branco é falar da minha infância. Não consigo falar de Castelo Branco sem falar da minha infância. Bem como não consigo falar da minha infância sem falar de Castelo Branco. Falar do lugar onde nascemos é sempre um exercício de construção de uma inocência perdida, à qual parecemos querer sempre voltar. Como se o ventre materno fosse, inevitavelmente, o sítio ao qual recolhemos sempre. Falar de Castelo Branco é falar da minha mãe, que me ensinou o toque. Falar de Castelo Branco é falar do meu pai, que me ensinou o olhar e a linguagem. É falar dos meus avós, que me ensinaram o lugar. É falar de setembros, dos dias longos, das noites quentes e de romãs caídas. A memória dos sentidos é uma sentinela. Há um comboio que atravessa a minha infância, ladeado por um rio que há-de desaguar num oceano onde mergulho sempre. Entrar nesse comboio é comprar uma viagem de retorno a um lugar inicial; esse onde pontapeei uma bola de “catchumbo” contra uma parede velha, enquanto o sol se levantava e depois pousava e depois se ouvia o ladrar dos cães que anunciavam a chegada da noite. O céu era sempre estrelado e na televisão a Europa sem fronteiras era um jogo de habilidades mais ou menos irrisórias. Era Verão. Na minha infância é sempre Verão. Não me perguntem porquê, mas é assim.
Nuno Leão, Castelo Branco, 2015
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